quarta-feira, 4 de novembro de 2015

A CASA QUE EU MESMO CONSTRUÍ.

GERALDO EUSTAQUIO RIBEIRO (geraldo@tremnet.com.br)

cidade: Betim
estado: MG
idade: De 61 a 70 anos


A CASA QUE EU MESMO CONSTRUÍ.


Estou sentado na varanda da casa que eu mesmo construí com muito suor e sacrifício, te ndo que dividir meu tempo com o trabalho e os meus filhos para quem eu construía.
E agora ela não é mais minha.
Perdi as forças para governar meu próprio corpo.
E preciso de ajuda.
No começo parecia que alguém me amava e não se importava em cuidar de um fardo sem utilidade, em pouco tempo a paciência pediu licença e foi embora levando consigo o amor e o carinho.
E comecei a me sentir um estranho dentro da própria casa que eu mesmo construí.
Até que um dia dois estranhos vieram me visitar e sem dúvida eram pessoas caridosas.
E depois de conversar com as pessoas que eu achava ser minha família, me fizeram a pergunta que eu nunca imaginara ouvir: O senhor sabe que estão querendo colocá-lo em um asilo?
Eu sabia, mas disse não saber.
A segunda pergunta foi ainda mais dolorosa: O senhor quer ir?
Até parece que eu tinha querer!
E sem ação, um não ficou entalado na garganta e percebi que teria de abandonar a casa que eu mesmo construíra e que o carinho e atenção que preciso tem que vir de fora desta mesma casa.
Fui para o asilo.
Os primeiros dias foram de dor e agora eu não ouvia mais a algazarra de crianças e os meus parentes são pessoas com o mesmo problema.
Durmo até a hora que o corpo pede para levantar.
Tem alguém que me leva para o banho.
Tomo o café da manhã e sento-me em uma poltrona e fico olhando para o mundo que agora termina em um muro alto intransponível para mim.
Tem hora para almoçar, estando ou não com fome.
Ainda não me acostumei com os gritos e gemidos, mas posso me deitar e levantar quantas vezes quiser e dormir ou fingir para que o tempo passe mais rápido.
Sou escravo de mim mesmo, do tempo e do tempo dos outros.
De vez em quando pessoas simpáticas aparecem para conversar parecendo querer substituir alguém que não deveria querer ser substituído.
E fico esperando não sei o quê.
Porque não sei se um filho que visita um pai ou uma mãe num asilo aind a é filho ou só mais um visitante, e também não sei se um pai ou uma mãe colocada em um asilo podem ou merecem ser chamados de pais.
Meus filhos agora são pessoas que não gerei e que cuidam de mim.
Dizem até que se alguém quiser pode me levar para passear, dormir uma noite ou outra, mas eu não tenho mais a casa eu mesmo construí, agora é propriedade dos herdeiros que eu gerei.
Não quero ficar indo e vindo.
Preciso me desligar do passado e esquecer o sorriso dos netos e os acertos e desacertos na criação dos meus filhos.
Agora só restam lembranças.
Inclusive da casa que eu mesmo construí.

Um comentário:

  1. Triste realidade de muitos ;são obrigados a apagar sua história de vida , só porque os personagens desta história saíram de cena ; como se a velhice tivesse anestesiado o coração e os sentimentos deste ser humano .O bom disso tudo , é que todos envelhecemos , e o plantio de hoje , será nossa colheita de amanhã .

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